REPOSIÇÃO
HORMONAL E CÂNCER DE MAMA
Alguns anos após seu início,
na década de 80, a reposição hormonal (TRH) tornou-se panacéia. Prevenia
doenças – inclusive cardiovasculares e algumas neoplásicas -, prolongava a
juventude e mitigava os desagradáveis sintomas da menopausa.
Essa visão foi, durante uma década,
sustentada por publicações na literatura médica, até que, um ano atrás, o
National Institute of Health, dos EUA, abriu um braço de sua pesquisa –
irrefutável pela metodologia e pela ausência de qualquer conflito de interesses
-, mostrando que com TRH não havia diminuição do risco de doenças
cardiovasculares e, em alguns casos, notava-se até um aumento considerável.
Isso deu início a um processo de reavaliação do conceito e do uso de hormônio
após a menopausa.
Há poucas semanas, os resultados percebidos
obrigaram à abertura de um outro braço dessa pesquisa pesquisa, agora lidando
especificamente com o câncer de mama, que é a principal causa de morte de
mulheres por neoplasias (tumores) e cuja incidência e mortalidade vem aumentando
ano a ano.
Foram estudadas 16.608 mulheres; metade delas
usou a combinação de estrógenos equinos e medroxiprogesterona por um tempo
relativamente curto (média de 5 anos), a outra metade recebeu placebo. No grupo
que utilizou hormônios verificou-se o seguinte: um maior número de casos de
câncer de mama; o diagnóstico foi mais tardio; e nos exames mamográficos houve
mais anormalidades e mais dificuldades de interpretação. Essas diferenças foram
estatisticamente significantes, não ocorreram por acaso.
Como ensinamento, fica a permanente dúvida
descartiana, que deve estar na mente de qualquer pesquisador, combinanda com um
ditado francês: “Na medicina, como no amor, não existe nem sempre, nem nunca”.
O
tempo de maturação das novas aquisições científicas deve ser repeitado, a
repetição das pesquisas e a busca da verdade devem ser constantes e, mais do
que isso, não se pode deixar de, pelo menos, considerar a possibilidade de um
viés financeiro quando os laboratórios farmacêuticos lucram abundantemente com
a reposição hormonal e financiaram uma boa parte dos estudos que comprovaram o
seu efeito benéfico em diferentes campos e que estão sendo agora desvendados.
Com relação às mulheres, elas devem sem
angústia ou pressa – pois o risco adicional é pequeno -, procurar os seus
ginecologistas para reavaliar a questão da TRH, que precisa, quando feita, ser
acompanhada caso a caso, com observação continuada. Na prática, se as usuárias,
de acordo com seus ginecologistas, decidirem pela reposição, suas mamas devem receber
atenção especial – traduzida por mamografias anuais, informando ao radiologista
sobre o uso dos hormôinios. Devem ser realizados também ecografia e exames
clínicos semestrais. Com isso, não se afasta o risco aumentado pela reposição,
mas se garante o diagnóstico precoce, que pode ser dificultado pelos hormônios.
Quando a detecção é precoce, a probalidade de
cura beira 100% e não é preciso retirar a mama. Na maioria das mulheres que
tratamos no Hospital das Clínicas, em estádios clínicos iniciais, logra-se,
além da cura, mamas em geral esteticamente melhores do que aquelas que tinham
de ser operadas.
O conceito da reposição hormonal mudou. Sua
indicação é mais restrita aos sintomas da menopausa, devendo ser usada na menor
dose pelo prazo mais curto. As alternativas ao seu uso são hábitos de vida mais
sadios e tratamentos não-hormonais, como os existentes hoje para a osteoporose.
Os estudos nesse sentido prosseguem e apontarão caminhos novos. Estão aí os
fitoestrogênios sendo amplamente experimentados. Eles são eficientes para
melhorar ondas de calor e a lubrificação vaginal. Suspeitamos – e estamos
pesquisando isso – que eles possam diminuir o risco para o câncer mamário, mas
isso ainda não está comprovado.
As pesquisas em medicina levam muito tempo;
por isso, é sempre bom que usuárias e médicos não se deixem levar por modismos
terapêuticos de forma acrítica e açodada, particularmente aqueles que agridem a
natureza e os processos fisiológicos normais.
José
Aristodemo Pinotti (†)